O que é ser homem, afinal?

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Ao longo desses anos de apostolado, produzimos algumas reflexões acerca da crise da masculinidade na sociedade de hoje, sobretudo sob a perspectiva cristã, chamando atenção para a necessidade de os homens assumirem sua vocação fundamental para, assim, defenderem o que realmente importa: a família, os valores e a fé. É algo que necessita de uma resposta urgente, decidida, pautada na vida virtuosa e na graça.

No entanto, em tempos em que prospera a idolatria das aparências, dos modismos, é importante ressaltar algo que temos de combater veementemente: a superficialidade.

Um extremo

De um lado, a virilidade é tomada como uma valorização extrema dos impulsos sexuais e demais vícios, não à toa muitos “homens” celebram seus feitos sexuais e aventuras com mulheres, como se isso fosse algum tipo de prova de seu sucesso enquanto seres masculinos; cultuam seu corpo, com o mero objetivo de atrair a atenção sobre si; enaltecem suas bebedeiras e destemperos; festejam quando, descontroladamente, demonstram sua superioridade em relação aos demais, com zombarias, chacotas e, até mesmo, violência sem razão.

O outro extremo

No outro lado, há a completa negação. “Homens” que têm medo de sua própria sexualidade e, por isso, a negam ou a bloqueiam, pois assim “evitam” o pecado; que ignoram a responsabilidade com seu próprio corpo, com a visão de que o material é totalmente supérfluo; que demonizam o consumo de qualquer tipo de bebida alcoólica, tabaco ou cachimbo; que optam por ignorar covardemente as situações adversas que se lhe apresentam; que acreditam que toda violência é ruim, e, por isso, devem ser pacifistas.

Via virtuosa

A pergunta a ser feita a esta altura é a seguinte: com base nesses dois polos apresentados, qual deles é, de fato, o comportamento que deve ser esperado de um verdadeiro homem?

A resposta é a seguinte: nem um nem outro. A postura viril é aquela que se baseia na virtude e, portanto, no equilíbrio entre esses extremos. Não que se esteja defendendo aqui um relativismo moral, pelo contrário, a verdadeira maturidade e, portanto, a virilidade, exige integridade e domínio de si, que não é conquistada pela negação das fraquezas e paixões, mas na sua correta ordenação para um objetivo sobrenatural.

Os santos não foram seres disformes, casos de estudo para um médico modernista. Foram e são normais; de carne, como a tua. – e venceram.” (São Josemaria Escrivá)

Cada vez mais, temos nos  deparado, no Bravus, com homens que, por falta de formação adequada ou maturidade, acreditam possuir uma identidade masculina sadia baseados APENAS em aspectos como: usar barba, não ingerir bebidas alcoólicas, vestirem sempre trajes formais (inclusive fechando a camisa até o último botão em qualquer circunstância, até mesmo nas ocasiões informais), fumar cachimbo ou charuto etc. Perceba que a palavra “apenas” foi destacada, isso porque nenhuma dessas coisas é boa ou ruim em si mesmas, ou seja, praticar essas ações ou negá-las não fará de ninguém um homem mais completo. Explico melhor: usar barba não faz que ninguém seja mais masculino, é apenas uma externalidade que, por si só, não quer dizer nada; não ingerir bebida alcoólica não é, por si mesmo, sinal de virtude, porque esse tipo de bebida não é imoral, tanto que o próprio Jesus a consumia; vestir trajes formais, nem sempre está  relacionado à modéstia; fumar (ou não) cachimbo, cigarro ou charuto, per si, não está ligado à virilidade.

A regra sadia nessa questão parece ser a mesma de muitas outras regras saudáveis – um paradoxo. Beba por estar feliz, mas nunca por se sentir extremamente infeliz. Nunca beba quando estiver infeliz por não ter uma bebida, ou irá parecer um triste alcoólatra caído na calçada. Mas beba quando, mesmo sem a bebida, estaria feliz, e isso o tornará parecido com um risonho camponês italiano. Nunca beba por precisar disso, pois tal ato racional é o caminho para a morte e o inferno. Mas beba por não precisar disso, pois beber irracionalmente é a antiga fonte de saúde do mundo.(G. K. Chesterton)

É evidente aqui que, em muitos casos, essas atitudes estão muito mais relacionadas à preocupação com a aparência, ou seja, com uma ação externa, que propriamente com um reflexo de uma interioridade madura e virtuosa. O que se tenta construir é um simulacro de homem e isso temos de combater com hombridade, pois é a erva daninha que cresce em meio ao trigo, é a trava que impede que se viva a verdade.

No que diz respeito à vivência comunitária eclesial, estamos experimentando o fel desse mal. É, muitas vezes, um ambiente emasculado, justamente porque se ensina os homens que ali estão a temerem ao mundo e a si próprios e a se esconderem das batalhas que lhes cabem. Há um estímulo à sensibilidade exacerbada, à percepção romantizada de Deus e de Nosso Senhor Jesus Cristo, à hipervalorização da misericórdia em detrimento da justiça… tudo isso contribui para homens frágeis, com pouco senso de sua real vocação na Igreja e no mundo.

É óbvio que se deve evitar situações de pecado, isso não está em questão. No entanto, se há falta de equilíbrio e, portanto, vício, ele nasce do interior e não do exterior. Caso se identifique a fraqueza diante de algo, é lícito afastá-lo. No entanto, o que se vê é o oposto: a completa demonização. Isso desconsidera as palavras de Jesus nas Sagradas Escrituras:

Escutai todos e compreendei: o que torna impuro o homem não é o que entra nele vindo de fora, mas o que sai do seu interior. Quem tem ouvidos para ouvir ouça” (Mc 7,14).

O verdadeiro homem

Temperança é moderação, não abstinência” (G. K. Chersterton).

Casto não é o homem que nega a sua sexualidade, que a demoniza, mas aquele que, percebendo a beleza de seu corpo, criação de Deus, acolhe o desejo sexual e o orienta para o cumprimento de sua vocação, movendo-o a dar a vida e a ser cogerador, independentemente de seu estado de vida: celibato, matrimônio ou sacerdócio.

O temperado não é aquele que condena seu próprio corpo como se ele fosse somente causa do pecado, mas aquele que cuida de si e de sua saúde ao mesmo tempo em que não idolatra sua aparência corporal nem a cultua. Não há como cuidar das pessoas próximas se você está doente ou fraco. Um homem forte é uma vontade de Deus. Um homem forte é capaz de defender a sua família e os mais fracos. Um homem forte é capaz de usar a sua força de forma prática em benefício dos outros (carregar peso, trocar um pneu, levar uma pessoa ferida até o soccorro etc.).

Um homem só é saudável na medida em que seu corpo, mente e alma o são. Um homem só é forte a partir do momento em que sabe que sua força vem de Deus e para Ele deve retornar em forma de serviço.

O homem virtuoso não é o que demoniza a bebida alcoólica, mas é aquele que sabe, com temperança, moderar sua ingestão, beneficiando-se do bem-estar provocado pela bebida e evitando, ao mesmo tempo, a embriaguez.

[…] nenhum animal nunca inventou nada tão mau quanto a embriaguez – ou tão bom como a bebida” (G. K. Chesterton)

O homem viril não é o utiliza suas qualidades ou feitos para oprimir os demais, não é aquele animal bruto e grosseiro que usa palavrões desmedidamente – que não sabe o momento adequado para aplicá-los –, mas quem compreende que sua força deve se traduzir na oferta de sua própria vida, com magnanimidade, para resguardar aqueles que não podem defender a si próprios.

O importante é que fique bem claro: a virtude está justamente no ponto central entre o vício por excesso e o vício por deficiência. Ou seja, a coragem, por exemplo, é o justo equilíbrio entre a covardia e a imprudência. Assim, ambos os excessos se configuram vícios e, desse modo, são ruins. “Virtus in medium est”, como afirma Aristóteles.

Portanto, é hora de superar a vida de aparências, de devoções externas, mas viver, com profundidade a vocação a qual somos chamados. Ser homem não é uma tarefa fácil e, por isso mesmo, não se resumirá a atitudes superficiais ou modismos. É preciso, para isso, tomar uma decisão e trilhar um caminho, assumindo corajosamente a responsabilidade sobre si e recorrendo sempre à intercessão de São José e ao auxílio de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Seja homem!

Bravus, pela hombridade.  

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2 Resultados

  1. Guilherme disse:

    Eclesiastico 3,27 b:

    Quem ama o perigo, nele perecerá.

    Há como nos aventurarmos na bebida e controlar o seu limite.
    Por acaso um vício pode ser controlado.
    Uma chama não corre o risco de incendiar uma floresta.
    Não há como controlarmos isso.
    A adicção é prejudicial seja qual for o seu estado.
    Fora os vícios fisicos e mentais dessa ingestão, ou por acaso não sabeis que vossos corpos são templo e morada do espirito santo? Poderia alguem por acaso macular a criação de Deus por livre e espontânea vontade?

    • Daniel P. Volpato disse:

      Confrade, se entendi corretamente teu comentário, você argumenta que mesmo uma pequena ingestão de bebida alcoólica levaria ao vício. Ora, isso é um tremendo disparete! Do contrário, toda e qualquer pessoa que já ingeriu alguma bebida uma vez na vida acabaria se tornando um viciado, e as estatísticas mostram que isso simplesmente não é a realidade.

      Veja, existem substâncias cujo consumo, ainda que em pequena dose, é moralmente ruim porque, por exemplo, afeta tua consciência, como a maconha. Não é disso que estamos falando aqui, mas de substâncias cujo consumo é moralmente neutro, como, por exemplo, a bebida ou o fumo. Essas, se consumidas de forma adequada, não são más.

      Seguindo tua analogia da chama: acender a chama significa, usando da razão, continuar bebendo até atingir o estado da embriaguez. Isso, para alguém que não tem o vício instalado, é algo racional, que pode ser controlado e bem exercido com a virtude da temperança.

      + virtude
      – puritanismo

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